quarta-feira

Um Despertar em Meio a Lembranças: 2ª PARTE

Naquele momento Dr. Sibis muda o semblante, além de assustado fica aterrorizado e absolutamente interrogativo. Quando de repente Nara começa a gritar compulsivamente.

- Por favor! Ajudem-me! Eu consegui fugir! Pensei que jamais conseguiria sair de lá, eles não me deixam, me prenderam! Por favor, onde estou?

Dr. Bittecout olha para Sibis (o jovem médico em seu primeiro dia de residência) muito preocupado, e sem saber como agir com aquela moça que nunca havia falado.

- Minha menina, calma, nós vamos te ajudar. Calma, por favor.

Mas Nara estava muito agitada, se debatia. De tanto se debater, e por estar amarrada, começou a ficar cheia de escoriações pelo corpo. E seu pedido de socorro não cessava, era cada vez mais alto e preocupante.

- Não, eles virão me buscar! Não vão me deixar em paz. Há muito tempo estava sob aquele domínio, não quero mais voltar! Por favor, me ajudem!

- Por favor, menina, acalma-se. Você estava dormindo por muito tempo, nós vamos te ajudar. - Dr. Bittecout tenta acalmá-la.

Naquele momento Nara parou de se debater e chorar por um breve momento, olhou fixamente nos olhos de Sibis, o jovem residente.

- É você! Eu costumava te ver nos meus sonhos! É você! Você que viria me salvar! Por favor, não deixe que me levem outra vez!

Novamente a moça começou a gritar, seu grito era tão alto que parecia um explodir, antes latente, de uma dor angustiante que naquele momento despertara. O som fazia eco pelos corredores do hospital. Dr. Bittecout olhou para Dr. Sibis de uma forma que o rapaz não entendera. O jovem médico só pôde perceber que aquele médico psiquiátrico, com tantos anos de experiência na profissão, nunca havia tratado de um caso parecido.

- Meu rapaz, fique com ela por um instante, preciso chamar os enfermeiros! – Disse Dr. Bittcout já saindo pela porta do quarto correndo, apesar da idade já avançada. Imediatamente Sibis se aproximou da moça, tocou-a na face.

- Calma, não vou deixar que nada te aconteça, tudo vai ficar bem. Dr. Bittecout e eu vamos cuidar bem de você.

- Não! Preciso sair daqui, preciso fugir, eles estão vindo! - Retrucou a jovem absolutamente desesperada.

De repente três enfermeiros adentraram no quarto, acompanhados pelo velho médico. Imediatamente aplicaram uma injeção tranqüilizante naquela jovem. O rapaz, ainda um residente, ficou assustado.

- Ela realmente precisa disso? Ela está com medo! Ela precisa conversar!

- Meu rapaz, você ainda é jovem, não sabe como tratar destes casos, ela vai ficar bem. Já está toda machucada de tanto se debater com as amarras. A família dela nunca veio visitá-la, mas e se resolverem vir? Após este fato, teremos que lhes comunicar que esta jovem acordou de uma espécie de transe, que chamamos aqui de esquizofrenia, e que durou sua vida toda. Exatamente vinte e três anos! E ainda tem a questão do trágico acidente que ela provocou!

- Meu Deus, ela ficou adormecida por tanto tempo? Que acidente? – Indagou Sibis.

- Sim. Ela está aqui há dez anos, desde que assassinou o irmão de um ano, em uma “inocente” brincadeira de crianças. A família a internou, e nunca, nunca, ninguém veio visitá-la. Pagam as mensalidades, perguntam como ela está, mas a verem? Ninguém nunca o fez. E com relação ao caso dela, pudemos diagnosticar que esta moça nunca falou, nunca aprendeu uma única palavra sequer. A principio foi diagnosticada como autista, porém, hoje, a vemos em um universo paralelo, - o que não deixa de ser um sintoma de autismo. Ela tem uma espécie rara de esquizofrenia, além de alguns ares de autismo. – Essa foi á resposta dada ao rapaz, de maneira extremamente serena pelo velho médico, que não estava menos preocupado.

Enquanto isso a moça já havia sido sedada e se acalmara. Os enfermeiros se afastaram. Outra vez ela olhou fixamente nos olhos de Dr. Sibis, e este percebeu que uma lágrima rolou de seus olhos, que deram um último brilho forte, antes de se fecharem. Muito sentido o jovem médico foi convidado a sair do quarto por seu instrutor, Dr. Bittecout.

- É, meu rapaz. Esta foi sua última paciente do dia, mas fechou com “chave de ouro”. Conseguiu até despertá-la! – Com um riso forçado Dr. Bittecout tentou acalmar o rapaz, que nada respondeu. Simplesmente abaixou a cabeça após um sorriso “amarelo” e se despediu.

Já era noite. Sibis estava em seu carro a caminho de casa. Chovia muito e a estrada não era das melhores. O hospital psiquiátrico onde Sibis havia conseguido residência ficava em uma cidade pequena, que estava a trinta quilômetros de sua casa. A viagem estava sendo sofrida. Durante todo o trajeto a imagem daquela moça não lhe saia da cabeça por um minuto sequer. Ele não entendia, mas parece que já a conhecia de alguma lugar. Mas onde? Não sabia e se perguntava– não sabia de nada, absolutamente nada! E aquilo o incomodava profundamente. Mas mesmo assim Sibis continuava a dirigir. Um vazio tomava conta de seu peito, um aperto estranho. Era a moça! Ele olhava para o lado, o banco do carona, e a via lá, sentada! Que é isso? Será que estou ficando louco? Dr. Sibis já começava a se questionar em pensamento. Como pode, nunca vi essa moça, e ela ter mexido tanto comigo!

Após alguns quilômetros... Em um relance muito rápido Sibis olha para o vidro do carro totalmente embaçado pela chuva torrente, vê um homem todo vestido de preto, bem ali, no meio da estrada... Ele não consegue frear! Tenta desviar, mas o asfalto está molhado – o carro de Sibis atropela o homem e atravessa a pista, logo na seqüência para no acostamento após bater em uma placa. Preocupado o jovem médico sai do carro para prestar socorro ao estranho pedestre desavisado. – Uma surpresa! Não tinha ninguém ali! Mas ao olhar para frente Sibis percebe um vulto negro, parecia o mesmo homem, que lhe olhava fixamente e... Desapareceu! Todo molhado o jovem volta para seu carro, respira fundo e prossegue sua viagem. Não via a hora de chegar o dia seguinte. Ele precisava desesperadamente se reencontrar com aquela jovem. (...).

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